26.5.08
Um dia
Tremeu quando viu o nome dele em seu e-mail. Na verdade, não foi bem o nome, mas o assunto.
“Preciso falar”.
Tudo havia sido complicado demais, dramático demais, barulhento demais, inexplicável demais. As conversas eram intensas, as coincidências eram absurdas, o sexo espetacular. Mas havia uma pecinha quebrada em algum lugar. Como um carro velho. Sentiam os ruídos, mas não achavam o problema. Sabiam que estavam chegando ao limite, que logo não haveria mais conserto. Insistiram, empurraram e tentaram além do que deveriam. Perderam o respeito e a paciência até se tornarem irreconhecíveis. O processo foi lento e tardio, o que só prolongou o sofrimento e criou mais mágoas do que era necessário.
Dois anos depois, o e-mail na caixa de entrada trouxe à tona tudo que ela jurava ter superado. Reviveu as sensações dos anos finais de casamento. O medo suspenso no ar, sabendo que brigariam a qualquer momento. O receio de falar qualquer coisa e ser mal interpretada. A impressão de que estava enlouquecendo porque era incapaz de enxergar o que ele dizia.
De todos os sentimentos que brotaram do e-mail, o mais forte foi a raiva. Ele sempre seria o calo? Aquele que se abre de repente, quando a sandália bate naquele exato ponto? Aquele dente que sempre sangra quando o fio dental passa por ele? A unha encravada? Aquilo que sempre está prestes a ferir?
Às 9 em ponto toca o telefone. Ela esperou alguns toques, fez ‘rum-rum’ e juntou forças para que a voz não falhasse.
- Alô.
- Oi. Sou eu. Tudo bem?
- Tá sim. Você?
- Também.
- ....................................
- ....................................
-... então. O que você precisa falar?
- Desculpa. É isso. Desculpa.
Era isso. A peça que faltava. O que fazia o dente sangrar, o calo arrebentar. Sentiu uma descompressão no peito, o ar entrando com mais força em seus pulmões. Quanto tempo ela sonhou com isso? Ele aberto, calmo, sóbrio e sem medo de sentir-se rebaixado por admitir que errou. Sem berros, explicações, acusações.
Esperou tanto por isso que nem sabia mais a razão. Na época, queria que ele voltasse com o orgulho atravessado na garganta, admitindo nunca ter se esforçado o suficiente, dizendo que ela merecia mais. Mas agora, via que não havia nada a ser feito. E se consolou sabendo que assim como ela, ele ainda tentava sair debaixo dos destroços daquele casamento.
- Desculpa também.
O telefonema seguiu sem que trocassem uma só palavra. E nunca se entenderam tão bem quanto nesses 34 minutos.
Ilustração: www.vidabesta.com
13.5.08
Tóxico
Hoje vai dar tudo errado e nem pense em me dizer que não. Não me contrarie porque preciso estar certa, é importante para mim, você não percebe? Não tá vendo o chuveiro que queimou agora, às 7 da manhã? Já comecei a ter razão. Nos dez minutos que tenho para não pensar em nada, apenas executar a seqüência de me molhar, fechar a água, passar xampu e sabonete, abrir a água, fechar novamente e me enxugar começando de baixo pra cima, nem isso pude fazer direito. Assim é com a gente. Tudo começou errado e não tem mais como dar certo. Eu realmente quero um amor perfeito, durável, autolimpante, sustentável e renovável. Não sei se suportaria por muito tempo a falta de angústia, de desconfiança, de pulgas atrás da orelha, de brigas inúteis por nada, de mal humor matinal. Mas queria ao menos experimentar a sensação de não sofrer por você nem por um segundo.
Todos os dias preciso fazer um esforço fora do comum para não ser tomada pelos pensamentos que são comuns a você. Me contaminei com eles. Adquiri o seu temor injustificado do amanhã. Passei a ver as pessoas com que convivo com olhos vesgos e míopes, não enxergo mais tão bem. Tenho crises agudas de depressão sem motivo aparente, só porque você também as tem. Não sei mais como me livrar de você. Mesmo não te vendo, não te tocando, não trocando nenhuma palavra com você, tudo que é seu ainda me faz mal. Me revira o estômago, me tira o sono, me dá tosse, me fecha a garganta.
Não sei como fazer para me desintoxicar de você de uma vez por todas. Dizem que o tempo é o remédio para o mal que não tem cura. Mas enquanto o tempo não chega, como faço para suportar as horas em que beiro o desespero? Passar por toda essa desintoxicação está sendo insuportável. Viramos vício. E, sinceramente, prefiro morrer do que ter uma recaída.
Ilustração de Maurício Nunes: http://mauricionun.blogspot.com
6.5.08
Amor eterno
- Tereza.
E o
de
- Querem
E todas apoiavam
Admirava Tomás
A
vidas
ilustração de Everson Cabideli.