11.3.08

Black

Se jogou na cama e fechou os olhos. Era o jeito mais fácil de se isolar do mundo naquele momento. Esticou o braço e alcançou o controle do som às cegas. esperava o primeiro acorde do cd do Morphine. Ia chorar muito. Precisava colocar aquele pra fora. Mas algo saiu errado. Aquele acorde não era Morphine. Demorou a reconhecer, apesar de tão familiar. Black álbum. Metallica. Era isso. Há quanto tempo não escutava? Imaginou se foi sua colega de apartamento quem colocou o cd , porque ela mesma nem lembrava que ele existia.

Pensou em levantar e mudar de música. Afinal, queria chorar. Sentia um cansaço grande e estava disposta a se entregar completamente. Não bastassem aqueles dias intermináveis de chuva, infiltração no banheiro, falta de grana e cabelo totalmente sem corte, tinha ele pra piorar. Por que tinha que ser tudo tão difícil? Mas ali naquela cama, ela não queria pensar nele. Preferia chorar sem motivo aparente, mas pensar nele não. Quando ela chorava, as coisas melhoravam um pouco por dois, três dias.

Mas começa Sad but True e ela se desconcentra. O passado rouba a cena e enxuga a lágrima que ia caindo. A imagem chega a ser engraçada. Ela, com sua camiseta preta, cabelos vermelhos batendo na cintura, unhas pretas, enlouquecendo com o Black Álbum. E mesmo depois de anos sem escutar o disco, ela riu ao perceber que ainda sabia a letra.

Pensou em interromper tudo pra ligar ele e dizervocê não sabe o que eu tô escutando.” freou o movimento porque sabia o que ele ia dizer. Estaria ocupado trabalhando ou simplesmente fazendo algo mais importante. Tudo era mais importante.

The Unforgiven começou e ela nada de chorar. Lembrou do clipe que amava, dos amigos da adolescência. Planejavam montar uma chapa pro grêmio do colégio, ajudar crianças pobres, abrir uma loja de vinis raros. Dinheiro pra quê? Poderiam viver felizes com o básico, fazendo o que amavam. Ninguém sabia o que era ser adulto ainda.

Sentiu saudade da coragem que tinha, da disposição em fazer diferente. Tinha 16 anos e uma infinidade de anos mais pela frente. Mas por que diabos tinha que achar que agora, aos 32, não havia tempo para mais nada? Que pânico era esse que a congelava e fazia aceitar tanta merda?

Quando Nothing Else Matters estava na metade ela decidiu que não desapontaria aquela menina de 16 anos. Senão fosse por ela, ali, no presente, seria pelo que ela imaginou que faria de sua vida. Cansou de agir como adulta, responsável. De se contentar com menos, com panelas ruins que deixam a comida grudar no fundo, com gente mal educada. Ia fazer uma faxina.

Antes que o CD terminasse e levasse o impulso embora, pulou da cama e correu para o telefone. Ligou rápido para ele antes que desistisse. Ele atendeu advertindo que estava sem tempo.

- É rápido.

- Diga.

- Vai tomar no cu.

E desligou. A atitude, aparentemente imatura, nunca soou tão adulta. Prometeu pra si mesma que não tiraria o CD antes de repetir a dose com seu chefe, com o vizinho de cima e com a caixa grossa da padaria. Não ia mais chorar sozinha pelos problemas dos outros. Três meses depois, guardou o CD, antes que ficasse conhecida como uma louca desbocada. Agora ia entrar em uma nova fase. Não deixaria que nada mais chegasse a ponto de ter que mandar alguém tomar no cu. Mas deixou o CD ali, bem a vista. Nunca se sabe, pensou.

40 comentários:

Dedinhos Nervosos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

HAHAHAHHAAHA :D
podiam fazer uma lista de discos inspiradores para mandar tomar no forevis!

Dedinhos Nervosos disse...

Esse texto foi uma saculejada a esta hora da manhã. Tô lembrando de algumas atitudes que deixariam a Anna de 17 anos muito desapontada. Vou começar a ouvir muita coisa que deixei pra trás hoje mesmo. Valeu. Beijos.

Dedinhos Nervosos disse...

Ahhh... vou começar tb a fazer a lista de pessoas heehhe

Anônimo disse...

Adorei isso! Rsrsrs, eu tenho essas coisas de vez em quando também. :*)

Dani Antunes disse...

kkk...

Acho que vou mandar um torpedo pro meu ex dizendo isso.

=P

Que vontade enorme de mandar meu ex tomar no cu! kkk

Bem...

"VTNC, desgraçado!"

E sem parênteses. ^^

Beijo... Adorei!!

Anônimo disse...

Pior que eu voltei a ouvir esse disco esses dias. Muito bom.

Fico imaginando ela mandando o cara ir para onde o sol não bate e depois uivando ao som de "Of Wolf And Man", a próxima, depois de "Nothing Else Matters"

Acho que eu e meu "eu adolescente" provavelmente sairíamos na porrada. Mas eu vencia.

Anônimo disse...

em tempo... apareçam por lá!

Darshany L. disse...

Uau, post surpreendente!
Metallica \o/

E, caramba, era o tipo de coisa que eu estava precisando ler hoje.

Emanuele Cordioli disse...

....
exatamente isso:

"Nothing Else Matters"

nada mais!

Gigi Pimenta disse...

Bons tempos aqueles do Pantera, Iron , Mettalica...não importa o som q ouvisse, na verdade a espectativa q tinhamos, era tão grande, tantas possibilidades! nunca deveriamos sair da adolescencia!
Bjo!

Anônimo disse...

PERFECT!!!!

Lilian Higa disse...

yeeeaaah!

Elisa Quadros e Valeria Semeraro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Elisa Quadros e Valeria Semeraro disse...

docinho, a próxima vez que vc disser que o texto tá ruim vou ouvir metallica e ligar pra vc. :P

Anônimo disse...

Onde eu consigo esse CD pelo amor de Deus!???
Vou gastar milhões de telefone!

Beijos

Di tutto un po' disse...

Foi vc que escreveu?Parabéns...
Quero começar a escrever meu livro!!!
Beijos

mim disse...

os textos desse blog são ótimos, leio sempre! parabens.

Padre Alfredo disse...

Isso é o que eu chamo de música inspiradora.
Parabéns!

Ana Paula disse...

Cara... Como eu amei esse post, vc não imagina...

Anônimo disse...

adoro qualquer coisa que vocês escrevam, mas esse texto entrou para o top 5.

parabéns!

Anônimo disse...

Muito bom do texto! Aliás, muito bom o blog! Cheguei aqui procurando pela autoria de um texto sobre depilação que recebi por e-mail e achei sensacional, mas não tinha créditos.
Parabéns!

Anônimo disse...

vcs são mto boas! mandam bem demais! estarão no blogcamp nesse feriado? torço para q sim, daí poderemos bater um papo!

Anônimo disse...

E a caixa grossa da padaria?
Se eu falar grosso com a caixa grossa da padaria ela me cobre de porrada...

Anônimo disse...

Du C******
Acho que nunca tinha lido algo tão apropriado para o meu momento..
Vou pegar meus Cds e deixar estrategicamente no carro.. porque ontem, no caminho pra uma festa, eu precisava de um deles, pra mandar gente tomar naquele lugar..
E esse negócio de achar que o tempo já passou e que quem passou dos 30 tem que se contentar com pouco, cancele.. Temos muito, é só olhar no lugar certo..
=*****

Isaque Viana disse...

Putz, bicho...
Muito bom! Muito bom mesmo!
Lendo o seu texto, lembrei do eu que fui um dia. Lembrei do tempo em que a vida corria tranquila, leve...
ô saudosismo.
Adorei o blog. Adorei o texto. Emocionante e ao mesmo tempo engraçado...
Na boa, vou ali colocar o black pra tocar.

beijão

Lia Drumond disse...

Eu também já fui muito idealista ao som de Metallica, bons tempos... Adorei. Bjs

Denise Telles disse...

.
meninas,
eu quero o RSS de vcs...
pede pra adicionar um feed nas configurações do blog please???
beijooossss
=D
.

Denise Telles disse...

.
e eu que escrevi e depois que fui ler o texto...
A-MEI!!!!!
tanta gente merecendo um 'vai tomar no cu' nesse mundo que eu acho que vou sair distribuindo black álbum por aí!!!
o problema é que sou bem capaz de precisar ouvir um tb!
adoro vcs meninas!!!
beijossssss
.

Jade disse...

Cheguei aqui pelo blog da Drika. Ela dizia que bem poderia ser ela, e eu acho que bem poderia ser eu!!

Demorei um pouco, mas também consegui chegar na fase do VTC e agora aos 44 procuro não deixar mais chegar a esse ponto!!

Belo post!!
Beijos!!

teo netto disse...

Cara esse texto me lembrou meus quinze anos, minha camisa regata mais que desbotada com a estampa do Metallica, que por incrível que pareça, ainda está enrolada num canto da minha gaveta. Potz! que saudade desses tempos, de tomar vinho, ou melhor dizendo suco de uva com alcool etílico e discutir por horas sobre os riffs cabulosos do Hetfield ou como teria sido a verdadeira morte de Cliff Burton.

Quanto ao texto...foda como sempre!

Bjs

Anônimo disse...

Tem tempo que não passava por aqui e já volto nesse espetáculo. Moro fora do Brasil e às vezes passo coisas que nem tento explicar p/ os outros... se jogar na cama eh clássico. Bom pensar no que fomos e pensamos e trazer um pouco daquilo de volta. Parabens. Otimo texto. Beijos,

Anônimo disse...

EU QUERO OUTRO POST!!!
VAMOS MENINAS, VAMOS!! EU ESTOU VICIADO NOS TEXTOS DE VOCÊS...

Unknown disse...

hahahah
é engraçado que essa semana eu peguei umas músicas do Metallica pra ouvir, depois de muito tempo sem pensar na banda, e como isso me aliviou! tirou de mim a vontade de mandar alguém tomar no cu.

Anônimo disse...

"Três meses depois, guardou o CD...".
A menina passou 3 meses xingando a cambada toda? que maravilha. =P

mas falando sério, adorei. eu também tenho uns discos assim, que me fazem querer mandar todo mundo praquele lugar escuro. às vezes eu to meio puto da vida, precisando desabafar, e ligo o "vitalogy" do pearl jam na altura máxima, canto junto com o eddie vedder, aos berros, e acabo nem mandando todo mundo tomar no cu porque minha voz vai embora.
enyão já sabe, se um dia vc me encontrar meio rouco, é porque eu queria muito mandar alguém se fuder e não consegui.
=)

Anônimo disse...

Elisa, belÊ?!

Pô aquela conversa rendeu, até voltei a desenhar meus personagens esse fds...

enfim, bj!

Anônimo disse...

Caralho, o Black Album é foda.
Me identifico tanto com isso... e ainda tô nos 24.
Beijo grande, adorei aqui. Aconchegante =)

leila disse...

demais esse post!!!!!!!!!

gritos tormentos e pesadelos disse...

essa é a influência da música na nossa vida, eu mesmo quando escuto metallica quando to puto...da vontade de quebrar tudo...sai na rua xingando todo mundo e quebrando tudo que vem pela frente

excelente texto...parabéns
té mais

Nessita! disse...

Muito bom! Adorei o post! Já me deu saudade de ouvir esse álbum.