30.3.07

Pequenas coisas

Nasceu normal, com todos os dedos do pé e todos os dedos das mãos. Dois ouvidos, dois olhos, um nariz e uma boca. Fizeram todos os testes: bateram palmas pra ver se ela se assustava, deixaram-na sem ar pra ver se reagia, furaram seu pezinho para fazer o famoso exame. Tudo em ordem.

A família respirou aliviada, tinham um bebê perfeito. Até os seis anos tudo correu muito bem. Brincava na rua com as outras crianças, caía, se machucava, voltava pra casa chorando igual a qualquer um da sua idade. Chegou a hora de ir para a escola. A babá prendeu seu cabelo com duas chiquinhas vermelhas, o uniforme estava impecável, camisa branca e saia-calça xadrez pregueada. No caminho até a escola começou a sentir que um bico tomava o lugar da sua boca. A testa franziu. Quem sabe pressentiu que sua vida iria mudar a partir daquele momento? Não, não seria a escola, a turma, os professores, as notas, as provas os culpados pela mudança em sua vida. Como você vai ver mais pra frente, o destino lhe pregaria uma peça. Nada demais, coisa pouca. Mas, sem dúvida, um incômodo para toda a vida. E até mesmo em sua morte.

Na hora de ir para sala de aula, não quis entrar de jeito nenhum. Agarrou a perna da mãe e começou a berrar. Dentro da sala os amiguinhos formavam uma fila e a professora tentou ser simpática:
- Venha com a titia, você vai ser a primeira da fila.
E lá foi ela, convencida pelo argumento que mexia com sua vaidade, ficou orgulhosa por ser a primeira. E nunca mais saiu do primeiro lugar. Não no sentido de ser a melhor mas sim porque parou de crescer. Começaram os apelidos e chaveirinho era o mais agradável deles. Teve que aprender a lidar com a situação, mas nem sempre foi fácil. Passou pela raiva, pela tristeza, pela depressão, pela irritação e por fim, pela resignação.

Ficou tão pequena que para ir ao salão de beleza tinha que levar sua própria almofada senão era impossível lavar o cabelo naquelas cadeiras onde se encaixam o pescoço. Até os dezoito anos, passava por baixo da roleta do ônibus e sempre davam desconto na sua passagem de avião. Chegou a hora de tirar carteira de motorista, mas teve que desistir, sua perna não alcançava o acelerador. Na boate, o barman se recusou a entregar o drink que ela pedia berrando com a identidade na mão. E teve um dia que não agüentou mais de tanta humilhação. Era o coquetel da empresa onde trabalhava, iriam lançar um empreendimento que mudaria o mercado. No meio da festa, depois de conseguir alcançar a bandeja de bebidas, tentou circular para ver se encontrava o rapaz que trabalhava no telemarketing e, segundo ouviu falar, não passava de um metro e sessenta. Enquanto procurava, sentiu uns tapinhas de leve na sua cabeça e viu que uma mulher muito, muita alta se curvava para falar com ela:
- Tá perdida? Quer que eu ajude você a encontrar sua mãe?
Sentiu o sangue subir rapidamente, coisa que era simples devido ao seu tamanho. As pupilas dilataram, a garganta secou e a boca se preparou para soltar seu insulto preferido:
- Vai tomar no... – desistiu de xingá-la e percebeu que pelo tamanho daquela enorme mulher, ela também deveria ter tido alguns inconvenientes na vida. Como consolo, pensou que pelo menos ela iria para a noite de núpcias nos braços de alguém, ao contrário da moça gigante. Virou-se para sua nova amiga e perguntou:
- Será que você pode me ajudar a encontrar uma pessoa?

Com a ajuda da grandona, achou o amor da sua vida, se casou, teve filhos, netos e, inevitavelmente, chegou a hora da sua morte. E pelo seu pouco tamanho, a funerária recomendou um caixão de criança, que era mais barato inclusive. O marido quase se convenceu, mas sua amiga grandona lembrou: ela não abria mão de ser enterrada num caixão três vezes maior que seu tamanho. E assim foi feito. Uma vez na vida, ou melhor, na morte, ninguém reparou no quanto ela era pequena.

Ilustração: Claudio França

27.3.07

Luana

Após seis meses de namoro, Júlio tomou coragem para falar o que sabia desde o primeiro minuto em que a conheceu.
- Luana, você é a mulher da minha vida.
Então ele fechou os olhos e partiu para dar o beijo que selaria a maior declaração de amor que já havia feito a alguém. Em vez da boca de Luana, Júlio se pegou beijando o travesseiro. Ela havia virado o rosto. A testa, bem ali no meio das sobrancelhas, estava enrugada. Até bico ela fazia. Não era exatamente a reação que ele esperava depois de um momento tão profundo.
- O que foi? Fui precipitado?
- Não.
- O que foi então? Fala pra mim.
- Você me chamou de Luana.
- Ué. Mas é seu nome, olha lá na sua carteira de identidade.
- Eu sei, né, Júlio, eu sei que é meu nome. Mas pela entonação, eu sei que você trocou nossos nomes.
- Trocar seu nome com o de quem?
- Com a da sua ex, da Luana.
- Ah, Luana, só pode ser brincadeira... você tá com ciúmes?
- Ciúmes nada. Tô com muita raiva. O meu Luana você fala assim, prolongando o a, tipo Luaaana. E termina a palavra com um ene bem pronunciado, como se tivessem dois enes. Luaanna, entende? E agora você disse “Luanáá”, com ênfase o último a, uma coisa abaianada. Você falou pra outra Luana que eu sei!
- Mulher de Deus, você tá perdendo o juízo? Os nomes são iguais, não falo de um jeito diferente. Larga de ser paranóica.
- O quêêê? Paranóica? Eu sou é sensível, percebo sutilezas, Júlio. E graças a isso, que você chama de paranóia, eu sei que você cometeu um ato falho.
- Ato falho? Mas a gente nem tinha transado ainda, como eu ia falhar?
- Ai, Júlio, puta que pariu. Ato falho é aquela coisa psicológica, quando você deixa escapar um pensamento que mostra o que realmente quer. Não tem nada a ver com brochar não. Só pensa em sexo, putz.
- Ah, ufa.
- Ufa?! Seria melhor se você tivesse brochado. Agora fui eu quem brochou. Enquanto você não admitir que me chamou de Luanáá, não coloco nem mais uma cereja no umbigo.
- Hunnnnpf... Luana, você tá querendo brigar porque isso te deixa excitada?
- Que saco, Júlio! Tudo é sexo pra você, que inferno!
- Luana... estamos os dois pelados, besuntados de chantilly até onde o sol não bate. Você com um fio dental tão pequeno que nem alcançaria meu siso, e não quer que eu pense em sexo? Você quer que eu pense em quê?
- Quero só que admita seu erro.
- Não errei em nada.
- Tá. Se você não admitir eu nem vou fazer a outra surpresa. Uma coisinha boba que treinei pra mostrar pra você.
- É...? Uma coisinha?
- Era surpresa... esse negócio de pompoarismo, sabe?
- Pom-pom-pompoarismo?
- É... mas não posso mostrar se você não admitir.
- Você quer que eu minta pra você, é isso?
- Não é mentir. É admitir.
- Não... você quer me humilhar. Quer provar que minha vontade sexual é maior que minha dignidade.
- Ih, tá complicando demais.
- É um absurdo, um insulto! Que cara de pau. Sua feminista moderninha, tentando me manipular pra ouvir o que quer, usando sexo pra mostrar que manda em mim.
- ... talvez.
- Lutam tanto pra ter direitos iguais e no final agem como homens. Que mesquinharia, que golpe baixo.
- Pode ser.
- Você deveria ter vergonha desse joguinho pré-histórico, dessa submissão falsa.
- E aí? Vai pedir desculpa ou não?
- Desculpa.
ilustração: www.vidabesta.com

23.3.07

A normal

Me senti diferente quando minha mãe perguntou-me de onde tirava minhas idéias. Não soube responder, mas nada do que ela pensava fazia sentido para mim. Via em minha mãe o modelo da mulher anulada, traída, submissa, acovardada, que se submetia a uma condição por medo de mudá-la, não importando o sofrimento que toda a existência de um casamento feito de mentiras lhe causava.

Vi uma mulher que foi linda se encurvar, se amargurar, secar. Tudo por causa de um amor que não foi correspondido, de um lar que não foi conservado sem máculas. Talvez a resposta para a pergunta que ela me fez estivesse justamente aí: mãe, não quero ser como você.

Sou pouco convencional, mas também não sou nada louca, sou extremamente comum, ordinária, passo despercebidamente nos lugares. Somente desenvolvi alguns pensamentos diferentes dos da minha mãe. Prezo a liberdade e tudo de bom que ela traz. E aceito as coisas ruins também. Acredito que podem existir várias formas de amar, que um relacionamento pode sim ter o sexo como o fator mais importante. Para minha mãe, isso é o absurdo dos absurdos. Então nunca consegui fazer ela entender que gosto de ser desejada e desejar. Aprendi a não ter vergonha disso. Mas por que demorei tanto a perceber isso? A avalanche de conceitos conservadores que eram despejados em meus ouvidos todos os dias não deixavam que as doses de culpa e vergonha que cada ato de prazer provocava se esvaíssem de mim.

Não existe nada pior que culpa e vergonha. E também o medo. É o trio fantasma, principalmente na vida de uma mulher que é mãe, é solteira e ama viver. Aos poucos percebo que me despir de normas e estruturas pré-estabelecidas é o caminho mais tranqüilo que posso seguir. Criei meu filho sozinha e hoje ele é um menino seguro, saudável, bem-humorado, sem medos ou travas. Nesses onze anos acho que consegui separar a mãe da mulher e não me tornar uma só. Ser flexível, mais uma vez, me ajudou. Meu filho me respeita, me admira, me ama e me elogia. Mais do que uma relação de mãe e filho, sou feliz por estar construindo uma relação entre um homem e uma mulher. Somos apaixonados um pelo outro, mas temos nossos espaços respeitados. Ninguém me ensinou a ser assim, mas acredito que minhas idéias tortas me ajudaram muito.

Agora quero aprender a ser também flexível num novo relacionamento. Quero o amor de Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre. Quero amar no momento em que sentir vontade e de maneiras diferentes, mas sem magoar ninguém. Sei que é difícil ou até impossível, mas gostaria muito de tentar. Minha mãe se fechou para um novo amor por acreditar que é impossível existir um homem fiel. Eu quero fazer o contrário. Quero acreditar que é possível amar e ser amada por pessoas diferentes, no mesmo instante. E ainda assim, ser uma pessoa normal.

ilustração: www.vidabesta.com

19.3.07

Algo bom

Cansei de me sentir pequena, de olhar pra trás e ver nada. Me sinto inútil e estúpida por ter pisado em tanto que plantei. Tanto falo em medir conseqüências, que diabos sei disso? Sempre que penso ter aprendido meus limites, me pego pisando na linha e tendo um déjà vu. Cometendo os mesmos pecados, reclamando da mesma coisa, magoando as mesmas pessoas e afastando elas de mim, numa tentativa subconsciente (que bom que alguma parte do cérebro ainda funciona) de colocar quem amo longe do perigo.

Sou tudo que condeno. Sou a mesmice, a mesquinharia, a água parada. Olho para trás e vejo quanta merda fiz achando ter feito a coisa certa. Não me arrependo, porque é assim que idiotas aprendem. Eles erram, erram, erram novamente até que um dia decidem pensar antes de agir. Sem arrependimento, mas com lamento. Magoar quem se ama deveria ser crime sujeito a penas legalizadas.

Por outro lado, tem também sua pequenez. Se não fosse sua falta de convites para festas, sua cara de desprezo quando me olha, o que seria de mim? Não finjo gostar de você e isso eu sei que é bom em mim. Posso cagar amizades, mas não quero agradar você em troca de um bom-dia dito entre os dentes. Pode guardar seus trocados pra quem sobrevive de sorriso amarelo. Pra quem engole suas grosserias, seu papinho de novo socialite em troca de jantares com gorgonzola, funghi secchi e um vinho do qual você finge entender.

Você fala como se tivesse nascido em berço de ouro, como se cagasse dólar. Você teve catapora, sarampo, diarréias, vomitou. Aposto que tem espinha na bunda, caspa. Você brincou na rua, chegou em casa sujo e não quis tomar banho. Foi criança como qualquer um, mas age como se tivesse nascido na posição em que está. Que espécie de pessoa apaga o passado? Menos mal que eu faço parte dele e sobrou borracha pra mim também.

Em boas maneiras, posso dizer que estou pouco me fudendo pro seu cargo na nova empresa, seu salário alto. Você é cada julgamento que faz, cruel, sarcástico, com uma ponta de inveja tão visível, mas que você pensa esconder bem, que dá medo de ver o resto. E se você ler isso, saiba que é a única manifestação de nojo que farei em sua homenagem, porque me recuso a perder tempo com sua vida. Deixo aqui, em algumas linhas, todo o espaço que você merece pra não ter que novamente tocar em seu nome ou deixar escapar um veneno quando alguém vier falar mal de você. Ah, sinto muito, esqueci de falar antes, as pessoas falam sim mal de você.

Posso ter meus problemas, perder a hora sempre, falar o que não devo. Posso não ser popular, escrever mal e me expor apesar disso. Posso levar a vida toda tropeçando em meus próprios pés, sem saber pra onde vou e muito menos o porquê. Mas se resta algo bom, se tem uma coisa que me faz acordar de manhã e sorrir com esperança, é saber que você não gosta de mim.
ilustração: www.vidabesta.com

13.3.07

Assim será

O vestido novo, o perfume, o salto, nada por baixo. Você vai se lembrar disso e me diga como vai suportar sabendo que não é com você que eu vou estar. Como vai conviver com a minha lembrança saindo do banho, o cabelo preso num coque mal feito, os fios sobrando na nuca, as costas molhadas que não vai ser mais você quem irá enxugar.

Como vai fazer para esquecer que era você quem me cobria todas as noites, por todos esses anos. E como irá acordar e lembrar que não é seu nome que vou chamar baixinho até seus olhos se abrirem. Como viver pensando que não será no seu rosto que irei passar a mão, que não será no seu ombro que deitarei a cabeça, que não será para você que irei sorrir meio de lado. Que não será em seu nome que farei a reserva do restaurante, que não vai ser do seu prato que vou roubar o último pedaço de torta.

Como continuar imaginando que não é você que está ao meu lado enquanto dirijo, que não é em você que penso quando paro em frente à vitrine de lingerie. Me diz com vai ser quando eu rir da piada que não é sua.

Como seguir em frente sabendo que não será por você que estarei esperando na varanda, que não será com você que irei ao cinema, que não será para você que comprarei a blusa que não é a sua cara. Não será seu nome que irei dizer quando estiver trepando, não será você que irá me ver chorando pedindo desculpas por ter errado.

Espero que saiba porque assim será.

8.3.07

Seria bom

Queria me contentar com menos. Não com pouco, mas com menos. Aceitar a rotina como um presente, uma dádiva que pouca gente tem de acordar e viver o mesmo dia todo dia. Ter sempre os mesmos problemas e por isso, ter as soluções certas.

Queria não ter vontade de mudar o cabelo e manter o mesmo corte por décadas. Ou apenas alisá-los. Cabelo liso é tão mais fácil de se cuidar. Queria não gostar de meus cachos.

Queria não enjoar de comer rúcula com agrião. Queria ter algumas manias que não se tornassem irritantes com o tempo, mas apenas bonitinhas pra quem vê.

Queria ser mais calma, quase acomodada. Me contentar em ficar em casa ao chegar do trabalho, ter sexo comum, sem novas posições, palavrões e puxões de cabelo. Queria me satisfazer com missa ao domingo, curso de espanhol às terças e quintas, visitas semanais à alguém da família, ginástica três vezes por semana, unha a cada 15 dias.

Queria não acreditar que estou privando meu gato de uma vida livre ao confiná-lo em um apartamento. E não pensar que ele pode morrer virgem.

Queria não desejar o novo, o desconhecido. Queria não gostar de frio na barriga e não ter a necessidade de experimentar sabores diferentes. Viagens apenas anuais, por 30 dias seguidos. Queria me contentar com excursões, que trazem pacotes prontos e tudo definido. Conhecer as pessoas que vão a esses passeios, ter curiosidade sobre a vida delas, ganhar a faixa de pessoa mais simpática do trecho Vitória x Paraguai.

Queria não gostar de show, de sentir o estômago pulsar junto com o coração quando os graves balançam o chão. Queria me contentar em passar em um concurso público e ser rica.

Queria me contentar com música baiana. Esperar o ano todo pelo Vital ou acompanhar micaretas por todo o Brasil, garantindo minha diversão simples e saltitante, com letras que não me façam pensar.

Queria saber ser mais cínica, porque falar a verdade dá trabalho e preguiça, mas não sei disfarçar. Queria me contentar com o que tenho, porque mesmo que pouco, é o que conquistei.

Queria acreditar em tudo que escrevi aqui, mas a impaciência não chega a esse ponto. Queria poder dizer que preferiria ser medíocre a questionar tanto, mas quem disse que não sou medíocre?

Queria aceitar o contentamento, porque afinal, contentar-se deve ter tudo a ver com ser contente. Mas que merda. Até isso parece pouco pra mim.
ilustração: www.vidabesta.com

1.3.07

Crenças


Você acredita em quê? Acredita, por exemplo, em sinais? Você quer muito um emprego no setor de marketing de uma marca de laticínios. Sua avó o convida para um lanche na casa dela e chegando lá, qual a marca do queijo, do requeijão e da manteiga? Você pensa se é coincidência, se é um mero acaso. Aí, voltando pra casa você cumprimenta seu novo vizinho que acaba de chegar, ele dirige o carro da empresa. Sim, a da marca de laticínios.

Há um tempão você não encontra com sua melhor amiga do primeiro grau. Vocês viviam grudadas, o recreio era só de vocês duas. Aí o tempo passa, os caminhos tomam rumos diferentes e quando você se dá conta, são mais de dez anos sem vê-la, mesmo as duas morando na mesma cidade. Sem saber exatamente por que, você se lembra dela. E na outra semana vocês se reencontram. E de novo e de novo. Isso já aconteceu com você? Como isso se chama?

Você acredita em promessa? Imagine a situação: você precisa escolher um apartamento para comprar. O mês é agosto. Você escolheu morar em Vitória, é lá onde trabalha, sai, faz compras. Passa agosto, setembro, outubro. Você tem até novembro para achar um apartamento e se mudar. Precisa fazer matrícula na escola para o filho e o prazo final está perto. Mesmo rodando o classificado de imóveis de cima a baixo todos os dias, passando as horas de almoço com os mais diferentes corretores (onde eles aprendem a ser tão chicletes?) nada de achar apartamento. Bate o desespero, você se vê indo até o Convento da Penha e se pega fazendo uma promessa se conseguir achar o apartamento desejado até o fim do mês. Em quinze dias você encontra o que procurava. Não em Vitória, mas em Vila Velha. Em um mês o apartamento está comprado e você morando dentro dele. E, acreditando ou não, nem por um momento pensa em não pagar a promessa.

Você acredita que vai ficar a vida toda com uma pessoa só? Acredita que dessa vez é pra valer? Acredita que essa era a pessoa que você tanto procurou? Mesmo quando você começa a ver as coisas de um outro ângulo, quando você se decepciona, quando tudo muda de cor, você ainda consegue acreditar? Ou vira teimosia, insistência, dificuldade em admitir o fracasso? Você conhece um casal de amigos, sai sempre com eles, ouve as histórias de viagem que eles contam, escuta os planos para daqui a cinco, dez e vinte anos. Vai com eles conhecer o novo apartamento que vão pagar por uns bons quinze anos. Pode um amor durar tudo isso? Ou será que as pessoas se agarram aos compromissos para poderem justificar uma relação?

Quando um amor vale uma promessa, um emprego vale todo o seu otimismo em achar que lá na frente há um pote de ouro, mesmo estando submetido a tanto estresse, o que faz você acreditar que um dia as coisas irão mudar? em deus, no diabo, em você, no buda, em maomé, no futuro? Quanto de convicção em um deles ou em todos é necessário para seguir em frente?

E o pior de tudo, mesmo eu não acreditando mais em um monte de coisas, ainda estou disposta a continuar. Não acredito mais no casamento, não acredito que um dia esse país ficará menos injusto, não acredito que um dia vou ganhar muito dinheiro com o que faço. Mas aqui estou eu. E você? No que você acredita para seguir em frente e não desistir de viver?