6.5.08

Amor eterno

Nunca houve dúvida. Quando lhe perguntavam quem era a mulher da sua vida, a resposta saía de sua boca quase antes que a pronunciasse, tamanha a certeza:
- Tereza.
Em
certo momento, os amigos ajudavam na resposta e diziam em coro 'Tereza'. Nenhuma era como ela. Os olhos dele brilhavam apenas em pronunciar seu nome. A paixão que Tomás sentia alimentava os sem amor de esperança. Via em Tereza tudo que considerava indispensável em uma mulher. Era exatamente o que faria se fosse Deus criando a versão feminina dos humanos. Cada fio ondulado de cabelo, a ponta do nariz, com uma pequena covinha, os olhos ligeiramente amendoados, os lábios discretos. O corpo de Tereza era um jardim, onde ele faria piqueniques por dias a fio. Acamparia, dormiria e se esconderia entre arbustos.

E o jeito de Tereza, ah, o jeitinho dela. A forma como ela desviava o olhar quando recebia um elogio. O jeito comportado de sentar, com as pernas sempre juntinhas, os joelhos bem encostados, e uma coluna retinha, exemplar para qualquer ortopedista. Quando Tereza passava pela roleta do ônibus, ele quase derretia. Apesar dos livros, da sombrinha, da bolsa, do troco solto nas mãos e do movimento do ônibus, ela dançava com a roleta. Seu corpo se deixava levar pelo balanço e ela mantinha o equilíbrio de forma admirável, sem dar um passo em falso, sem derrubar nem mesmo uma moedinha. O hálito de Tereza era o mesmo, desde criança. E quando conversavam, ele sentia-se confortável, como se sente qualquer um com cheiro do lençol de casa. Seria capaz
de morrer
feliz se morresse durante um beijo com Tereza.

Todo sábado à tarde, Tereza encontrava as amigas pontualmente às 17h. Entre atualizações da vida alheia, citavam os últimos acontecimentos de suas próprias vidas. Em determinado momento, todas olhavam para Tereza e sorriam. Ela sabia o que isso significava. Dizia apenas:
- Querem saber
de Tomás, não é?
E todas apoiavam seus
queixos sobre as mãos, sob risco dos mesmos se espatifarem no chão. Tereza virava o centro das atenções ao descrever todo o amor pelo rapaz. Desde pequenos, dizia ela, os dois sentiam uma afinidade uterina, que parecia anteceder o nascimento. Perto dele, Tereza perdia o rumo. Não sabia bem para onde olhar, onde colocar as mãos ou esconder o suor que as fazia escorregadias.

Admirava Tomás pela forma como tratava as mulheres. Não sentia ciúmes, muito pelo contrário. Apenas a fazia ter mais segurança de que seu futuro com ele seria de respeito e carinho. Adorava quando Tomás estava preocupado. Não por gostar de vê-lo sofrer. Mas porque quando o consolava, dizendo que tudo ficaria bem, ele reagia sempre da mesma forma. Projetava o lábio inferior para fora, fazendo um biquinho de um lábio . Em seguida dava um longo suspiro, olhava para ela e dizia: vai nada. E os dois morriam de rir juntos. O corpo de Tomás era a casa
que
ela pagaria uma vida inteira para morar. O ombros largos, os braços naturalmente fortes e até aquela barriguinha que teimava em permanecer ali serviriam como abrigo para todos os dias.

A paixão durou a vida inteira, mesmo quando ambos se casaram. Tereza com Alex, Tomás com Joana. Mas não houve um dia sequer em que os dois não imaginavam o que teria sido de suas
vidas
se tivessem superado o medo e declarado o amor de um pelo outro.


ilustração de Everson Cabideli.

20 comentários:

Dedinhos Nervosos disse...

Mais um ótimo texto.
Manter sentimentos trancafiados num cofre é sempre frustrante. Eu prefiro sempre jogar limpo. Às vezes até num luminoso, se preciso for.

Anônimo disse...

É... e não adianta, dificilmente a teoria e a prática coincidem. Hunf. O texto é que tá bárbaro! Parabéns!

Bezzos,

Gustavo Lopes disse...

Senhoras e Senhores eu adoro este Blog... Passarei horas lendo ESTE texto especificamente...Parabéns é lindo!!!

Vamos transformar essas histórias em filme?!

Anônimo disse...

Só um amor assim pra ser ETERNO!
amei o texto!

Sil disse...

Muito bom, roteiro perfeito pra um filme de amor.

Anônimo disse...

Se foi pra matar, podem ter certeza que estão no caminho certo.
Parece um filminho na cabeça.
Parece um reboliço no estomago.
;\

Perfeito!

Mostrarei ao resto do mundo apaixonado.

Anônimo disse...

Se foi pra matar, podem ter certeza que estão no caminho certo.
Parece um filminho na cabeça.
Parece um reboliço no estomago.
;\

Perfeito!

Mostrarei ao resto do mundo apaixonado.

Anônimo disse...

o velho mal do silêncio...

Larissa Dardengo disse...

Ai...
(foi a única coisa que saiu quando terminei o texto)

Perfeito demais. Faz a gente imaginar que toda paixão platônica é platônicamente correspondia. rs

bjs

Giovana disse...

Tem coisas que só são perfeitas quando não se concretizam, né?
Idealização, vamos assim dizer.
Adorei o texto!!!

teo netto disse...

potz! me deu uma tristeza no final, tadinhos.

ótimo texto!
beijos

Anônimo disse...

ha!
parece que eu li a minha história.. ainda não casei, mas tenho um amigo como o Tomás!

Anônimo disse...

Perfeito, como os demais. Fiquei com peninha deles no final tb. Babi corre e se declara pro seu Tomás menina!!!

Daniele Middleton disse...

Primeira vez que venho aqui. Acredito que o fato do blog ter o nome de "REDATORAS DE MERDA" seja so uma brincadeira mesmo porque os textos sao otimos!!!
Abracos

Anônimo disse...

O texto é incrível; me vejo um pouco no texto, acho que é comum passarmos por experiências como a dos dois.

Adorei =*

Rodrigo Carreiro disse...

O frustrante é ver que nós, ou quase todos nós, ainda guaramos o que sentimos com medo de ser feliz :/

Kakaya disse...

Ui!A coragem é a melhor qualidade humana!Pq dela derivam todas as outras...
Ótimo texto!

milenamb disse...

Putz, tava parecendo mesmo bom demais pra ser verdade...
beijos

Thaís Motta disse...

simplismente , perfeito
ameeeeeeeeeei , como amo todos os outros ; )

André Debevc disse...

ótimo texto, mais uma vez. tenho que agradecer milena pela indicação do blog. se der, visitem o meu www.cronicasdeguardanapo.blogspot.com
André