29.4.08

A última cena

Ele, ali caído no chão, depois de passar por 13 andares. Eu não vi, me disseram e fico imaginando. O prédio inteiro acordado às 5 da manhã, polícia, ambulância, pessoas na janela sem entender. Ele não estava na rua, havia caído na área comum do prédio.

Recebi a notícia às 10 da manhã, estava no trabalho. O telefone tocou, me chamaram e ouvi meu pai com a voz tomada pela dor, pelo desespero e pela confusão. Ele gritava para eu ir imediatamente para casa, mas não dizia por que motivo teria que fazer isso. Até que interrompeu com a frase lacerante: seu irmão está morto.

O tempo do fato até hoje soma 136 meses. Meu irmão se chamava Marcelo, estava a um mês de completar 21 anos. Desde o dia 29 de novembro de 1996, não fico mais de um dia sem pensar nele e no modo como ele morreu. Remonto muitas cenas, mas nenhuma delas me convence. Mas agora não tenho mais nada para acreditar, a não ser na certeza de que alguma coisa está errada.

Marcelo estava no segundo ano de Farmácia, na faculdade federal de Juiz de Fora-MG. Há poucos dias resolvi rever suas fotos que ficam guardadas na casa da minha mãe. As seqüências de álbuns dão um filme de aventura de sessão da tarde, com títulos como curtindo a vida adoidado. Marcelo mergulhando, Marcelo no Pico da Neblina, Marcelo em um churrasco, Marcelo com a namorada, Marcelo na faculdade. Pode ser pretensão dizer que ele de maneira nenhuma tinha tendências suicidas, não conhecemos bem nem a nós mesmos. Mas conhecia meu irmão e sabia que tudo que ele fazia era planejado e organizado. Acredito que se a intenção dele era morrer, ele deixaria uma carta, não compraria ingressos para um show no próximo fim de semana, não teria marcado de passar o Natal comigo.

Mas vou deixar minhas impressões de lado e apenas relatar o fato com base nos depoimentos dos quatro amigos que estavam com ele.

Cena 1: todos estão no apartamento da minha mãe, 13º andar. Marcelo e mais quatro amigos iriam ver um jogo de futebol pela TV. Todos entre 18 e 20 anos. Todos bebiam e eram amigos de faculdade.

Cena 2: todos bem e por volta da meia-noite meu irmão começa a passar mal. Dão um banho nele, colocam ele para dormir. Disseram que ele ficava perto da janela como se quisesse se jogar. Todos resolvem dormir na casa da minha mãe para ficar com ele. Porém um deles acorda e vê que meu irmão se jogou pela janela da cozinha.

A última cena é a do meu irmão, caído no fosso do prédio. E agora só existem as perguntas: por que não levaram ele para um hospital? Por que não houve investigação e não fizeram necrópsia? Por que tendo mais quatro pessoas, o atestado de óbito ficou definido como suicídio? Por que todos que eram amigos dele sumiram?

Engraçado que só me vem à cabeça a série Cold Case e a incansável Lilly Rush, que revira tudo para solucionar casos já há tempos arquivados. Por mais que doa, por mais que eu chore todas às vezes que o assunto vem à tona, ainda prefiro confiar no meu instinto que me diz: aí tem coisa. Depois de quase doze anos, continuo me fazendo as mesmas perguntas. E decidi que a partir de agora, mais do que nunca, as respostas vão fazer parte da minha obsessão.

16 comentários:

Dedinhos Nervosos disse...

Fiquei sem saber se isso é verídico ou não. Espero que não. Mas se for, eu sinto muito e, realmente, é esquisito uma pessoa que planeja tudo resolva pôr fim na sua história assim...

Olly disse...

Eu tbm fiquei sem saber... Caso seja, tbm sinto muito. E de verdade, eu não conseguria dormir sem pedir a reabertura do inquérito!!!!

Nakita disse...

Isso é verdade? o.O

Anônimo disse...

vc é uma mocinha muito forte,imagino que deva ser uma dor constante, mas acredite que um dia alguma lilly rush vai resolver o caso...vc é muito querida..bjnhos..saudades..aninha

Anônimo disse...

tb nao sei o que dizer. se elogio o texto ou se te dou força de correr atrás da verdade.
às vezes é melhor não saber.

Anônimo disse...

Olha, também não sei se o relato é de um fato verídico ou não. Mas se eu fosse a Lilly Rush eu desconfiaria das unanimidades. Quatro ficam junto de um que passa mal? Três já acho muito. Numa turma de cinco, quando um passa mal, no máximo ficam dois com o sujeito. O normal é ficar um. Solidário. Paternal. Os outros vão pra casa ou continuam a farra. Lilly perguntaria quem era o amigo "brother"? Aquele a quem seu irmão confiaria a vida. E aí começaria a fazer perguntas obsessivas. Para você, que não é a Lilly, a vida continua, a sua vida.

Anônimo disse...

bah, nem sei o que faria se fosse eu, meu irmão é disparado a pessoa que mais amo no mundo!

cks disse...

Sempre que assisto Cold Case, me pergunto se um dia, nossa polícia dará a devida importância e/ou terá condições de solucionar esses casos.
Com pequenas dúvidas já é difícil conviver, imagino com essa, então.
Espero que, um dia, vc descubra a verdade.

Cristiane disse...

Nossa...
Impressionada!

Darshany L. disse...

cold case é o melhor

Anônimo disse...

Espero que a sua vida não fique estagnada devido ao fim da vida de seu irmão.

Faça como ele e tenha um álbum que poderia se chamar de suas aventuras.

Um Beijo.

Anônimo disse...

Todos sabemos que, diferentemente dos seriados mencionados, as coisas não funcionam muito bem se não forem rentáveis.

[ ]'s

http://suburbanismos.blogger.com.br

Anônimo disse...

O caso é verdade. Eu estava do lado dela quando o telefone tocou. Eu não sei o que dizer a respeito de perguntas que vão ficar para sempre.

Tenho a dizer a respeito da sua vida que, olhando de longe (e me desculpe pela intromissão, amiga), é feita de um filho que deve estar lindo, de um pai carinhoso, de uma mãe que a chama de flor, de um
monte de amigos incríveis e pessoas especiais que sempre estiveram aí ao seu lado. Sem falar de uma carreira cheia de realizações em uma empresa que você deve ter montado com três características que tem de sobra: coragem, talento e honestidade.

Eu olho pra você como exemplo para minha própria vida.

Gosto de você demais da conta! ;-)

Beijão, Rê.

Lucas disse...

Nossa! que coisa. Já vi caso parecido e não foi no Cold Case.

Anônimo disse...

Já faz parte da minha obsessão xD
Amando aqui, muito.

Anônimo disse...

ei... não sabia dessa sua desconfiança a respeito do que aconteceu. aliás, não sabia como tinha sido, também.
e lembro daquela coincidência esquisita de quando postei um texto sobre o assunto bem no dia. O.o
quem sou eu para querer dar algum tipo de conselho, mas acredito que alguns assuntos às vezes merecem ser guardados com cuidado.
independente de qualquer coisa, quero você bem. é isso que me interessa.

beijo